Ela não foi a primeira e muito
menos a última, mas talvez tenha sido a mais influente da história mundial. A
queda da nobreza, a perseguição ao clero, o extermínio do rei e a ascensão da
burguesia foram choques tão profundos nos velhos e enrijecidos estados
europeus, que a tornou a mais lembrada das insurgências populares até os nossos
dias. Seus ideais de “liberdade, igualdade e fraternidade” perduraram pela
história, servindo de modelo para inúmeras outras revoluções pelo mundo, e
inspiraram a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
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A liberdade guiando o povo - Delacroix |
Estou falando da Revolução
Francesa de 1789 que, tradicionalmente, é comemorada no dia 14 de julho, data
na qual a velha prisão da Bastilha, símbolo do poder real e um depósito de
armas, foi tomada em Paris. Mas é claro que tudo não se resume a um único dia.
Na verdade a data é simbólica, já que a população francesa se mantinha inquieta
e se revoltara contra o clero e a nobreza meses antes, até mesmo anos antes.
Tudo começa ainda no século XVII,
quando os ingleses fizeram sua própria revolução e exterminaram o seu rei.
Entretanto, naquele país, as coisas se reorganizaram e um novo rei foi colocado
no trono, sendo controlado pelo parlamento. Era o fim do absolutismo monárquico
na Inglaterra, e o começo dos problemas na França, já que os ideais do
iluminismo se difundiam cada vez mais pelo continente europeu. No próximo
século, as colônias inglesas na América se revoltariam contra a metrópole e com
ajuda do Rei Francês conquistariam sua independência.
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A Tomada da Bastilha - Jean-Pierre Houël
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A atitude francesa era no mínimo excêntrica,
afinal o país mantinha sua população em petição de miséria, e a explorava
absurdamente, indo contra qualquer ideia de liberdade. A sociedade francesa
estava dividida no que se chamavam os “três estados”: a nobreza e o clero não
trabalhavam e formavam o primeiro e o segundo, enquanto o populacho
(comerciantes, burgueses e camponeses), que de fato trabalhava, formava o
terceiro. Assim era a sociedade do “caridoso” rei: de um lado uma miscelânea de
palácios, nobres, perucas e marionetes reunidas sob um único teto, o suntuoso
palácio de Versailles, e do outro, a massa empobrecida e explorada para manter
o luxo e o poder do reino.
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Galeria dos Espelhos - Versailles |
Tais condições não se manteriam
indefinidamente. Os louvores ao rei em pouco tempo se transformariam em uma
gritaria por pão e direitos, e o isolado monarca seria levado para Paris. Bastou
uma frustrada tentativa de fuga para a Áustria,
rapidamente interceptada, para selar o destino da família real: Rei e Rainha
seriam guilhotinados em praça pública, o herdeiro trancado e esquecido, e o
povo impediria qualquer um de falar suas últimas palavras.
Aquele povo que honrava e amava
seu rei simplesmente lhe virou as costas, mas não sem antes ter sido abandonado
pelo mesmo. Sim, abandonado. Para a sociedade europeia da época, rei e nação
eram um único organismo, e a fuga do monarca mostrara que cabeça e corpo haviam
se separado indefinidamente. Por isso nenhum peso de consciência impediu que as
cabeças reais rolassem sob o julgo da guilhotina.
Os meses e anos seguintes à
revolução foram difíceis e tumultuados, e o fim do absolutismo monárquico foi substituído
pelo início da autocracia imperial. A França se tornaria um império forte à
custa da conquista e destruição de diversos países europeus. Napoleão, levado
ao poder graças às loucuras do pós-revolução, seria um Imperador itinerante e
belicoso, acabando por ser esmagado sob o próprio peso.
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Código Napoleônico - Primeira página |
Apesar do “governo do povo” ter
sido exterminado pouco tempo depois do fim da monarquia, os frutos da revolução
não seriam esquecidos. Até mesmo o Império napoleônico legou direitos na sua
constituição que perdurariam até os dias de hoje, todos baseados nos princípios
da Revolução. E após mais um século de tumultos e revoltas, a França chegaria
ao século XX como um poderoso estado democrático.
Analisando a história do mundo
nos últimos dois séculos, é impossível não traçar um paralelo com a Revolução Francesa.
Governos que pareciam eternos foram derrubados pelo povo; verdades absolutas
foram desmanteladas e novas perguntas surgiram. No início do século XX o
Império Russo foi implodido por uma revolução.
Hoje, no início do século XXI,
diversos países árabes revoltam-se contra seus governantes absolutistas. A
ligação entre essas manifestações e aquela do fim do século XVIII é mais que
notória, é inspiradora. Os ideais da Revolução Francesa, que em 2012 completa
223 anos, nunca estiveram tão presentes!
Grande abraço!
-- Thiago Amorim
Para saber mais:
“A Era das Revoluções” – Hobsbawm