sábado, 17 de outubro de 2009

O Pouso

O pouso foi estranho. Diante da nave jazia o que um dia foi uma gigantesca metrópole vívida e cosmopolita. Eles não conseguiam entender o que havia acontecido. Boa parte da região havia sido engolida pelo mar e a pouca distância notavam-se inúmeros arranha-céus rodeados por água, como ilhas, porém abandonados. Haviam parado sobre uma enorme estrutura de aço que devia ter desabado alguns anos antes, mas ainda mantinha muitas das suas características de antes da queda.
            Resolveram caminhar um pouco, mas estranharam a pouca luz do sol e a espécie de neblina avermelhada que tomava conta de tudo. O clima era sombrio e bem diferente. Pensaram que fosse algum tipo de catástrofe natural ou algo parecido, mas estavam confusos, já que não conseguiam avistar um ser vivo sequer. Era estranho. Sem humanos, poderia haver outra forma de vida dominante ali, ou ao menos qualquer outro animal em busca de abrigo ou comida.
            Cada vez mais contrariados e havendo percorrido grandes distâncias, não conseguiam compreender o que poderia ter acontecido. Sempre encontravam desolação e poucas formas de vida. Formas de vida, essas, bem diferentes do que acreditavam puder encontrar.
            A noite chegava, toda a região estava bem mais escura, por isso resolveram voltar até a nave e esperar pelo dia seguinte, onde com mais luz, poderiam analisar melhor o ambiente.
            Needle foi o último a recolher-se, e enquanto dirigia-se para o veículo encontrou um objeto no chão entre entulhos que estavam próximos da estrutura desolada, por sobre onde pousaram. Viu que se tratava de papel e continha algumas informações na língua da região. Resolveu levar para dentro da sua cápsula e tentar traduzir o dialeto contido ali.
            Ao entrar, dirigiu-se ao seu aposento e posteriormente juntou-se aos outros cinco que haviam vindo com ele onde começaram a dialogar sobre o que poderia ter acontecido com aquele lugar. Há cinco dias viajavam e até agora só haviam encontrado cidades fantasmas e desoladas.
Quando partiram, pretendiam encontrar grande quantidade de vida e muita prosperidade, mas parecia que a vida na região evaporara, em alguns lugares era o que de fato devia ter ocorrido, devido à forma com que as coisas estavam calcinadas e reviradas.
Needle então compartilhou a sua descoberta, o texto no papel encontrado no chão, e resolveram utilizar o tradutor universal para decodificar o que quer que fosse aquilo. Incluíram a sequência de palavras que haviam encontrado durante todo o trajeto e assim o computador pode ler de forma mais rápida a estranha e complexa língua encontrada por eles ali.
Após esperarem cerca de três minutos, com grande apreensão, descobriram o que era cada uma daquelas palavras e assustaram-se. Jamais podiam ter imaginado que destino sombrio a raça humana havia tomado e por motivos tão fúteis.
O texto encontrado por Needle era um jornal que incrivelmente havia permanecido intacto diante de toda a devastação encontrada.
A tradução dizia:

Dia 15/09/2048
Hoje as medidas tomadas por nosso governo serão mais severas em toda a América Latina. Diferentemente do que aconteceu a Paris e Nova York na semana passada, e também a São Petersburgo há 30 dias, novas medidas de segurança serão tomadas para que o número de mortes seja maior. Os crimes cometidos por esse povo que antigamente conhecíamos como latinos devem ser punidos com afinco e certamente ganharemos a guerra contra a miscigenação das raças. Apenas medidas severas de controle e erradicação desse povo degenerado poderão garantir que, nós do norte, consigamos nos livrar do incômodo trazido por essas pessoas que, certamente, não deveriam ser considerados como parte da raça humana.
O front de guerra na China, onde outra raça terrível existe, só terá força quando acabarmos com esse povo que traz incômodos em nossas fronteiras, e o esforço será maior na frente chinesa quando tivermos erradicado o povo latino. América e Europa triunfarão!
            Trecho retirado do Discurso recente do Presidente dos EUA

       Needle e seus amigos descobriram o que havia acontecido com a Terra. Ligaram os fatos e os artefatos encontrados durante a visita e finalmente entenderam porque não havia ninguém para recepcioná-los onde quer que fosse. Perceberam que o povo dali não era pacífico como dizia nas cápsulas enviadas como forma de boas vindas ao povo do espaço. A intolerância em proporções colossais gerou uma guerra entre raças dentro de apenas uma, a raça humana. Isso destruiu completamente a vida no planeta. As cidades agora eram enormes lixeiros a céu aberto e a neblina vermelha explicava-se pela utilização em grande escala dos artefatos nucleares.
Os seis visitantes que haviam pousado no nosso planeta foram embora satisfeitos. Sua civilização certamente não gostaria de ter conhecido a raça humana, raça essa que erradicou a si mesma pelo motivo mais fútil entre todos: o ódio pela diferença. Os homens não haviam entendido que ao machucar os outros, machucavam a si mesmos.


-- Thiago Amorim

2 comentários:

Andréa Brandão disse...

Passei aqui ontem, li e esqueci de dizer que o texto ficou MUITO BOM!!!

Parabéns, vou ficar esperando mais...

Beijão!

Unknown disse...

Thiago vc detonou meu amigo. Gostei da introdução e de como a história se desenrolou.

Assim como a andréa.
Parábens, vou ficar esperando mais.....
abraços
Tairan frança